Artigo enviado por Nelson Carvalheiro, a quem agradeço.
Na velha Rua do Ouro, que começava na Rua Tuiuti, havia nas proximidades do AR uma padaria, a papelaria do pai do Washington, um bazar e, na esquina com a Rua Cel. Luis Americano, uma oficina de conserto de sapatos.
Nesse
pequeno trecho, com algumas poucas residências, quase todos os dias, em geral
no final da tarde, um grupo de adolescentes jogava futebol com uma bola pequena.
Quando algum veículo se aproximava, alguém gritava e a brincadeira parava
imediatamente, reiniciando logo depois. O mesmo acontecia quando alguém passava
pela calçada.
Num belo
sábado, um pouco antes do anoitecer, surgiu na calçada um casal de namorados e
o jogo parou. Um dos meninos, franzino, mas metido a valente, e muito chegado a
brincadeiras, reconheceu o rapaz e começou a gritar.
– Sai prá lá
Juventino, aprende a jogar bola!
Ninguém sabe
como mas, em vez de ficar parada, a bola voou lentamente na direção da calçada.
Para azar de todos, ela bateu nas pernas da garota, deixando uma mancha escura
em sua saia. Não foi nada grave, mas todos gritaram com o provável autor do
feito e alguns se apressaram a pedir desculpas à moça. O rapaz não disse nada,
mas fuzilou com os olhos o suspeito da proeza.
Na
segunda-feira à noite, alguns daqueles jovens estavam na sala de aula
localizada no andar térreo, à esquerda de quem entrava no prédio pela porta
principal, aguardando a chegada do professor de Trabalhos Manuais. Antes de ele
chegar, entrou na classe o Antonio Carlos, o “Nenê”, rastreando a sala com os
olhos, procurando alguém.
O Nenê era
um pouco mais velho que a maioria dos alunos daquela classe e tinha uma altura
também acima da média. Ele havia conhecido a moça havia pouco tempo e era a
primeira vez que estavam saindo juntos. Naquele tempo, era comum que os casais
de namorados passeassem juntos pelas ruas do bairro, sem temer grandes ameaças
a sua segurança.
Ninguém se
importou com a chegada do Nenê, até que ele visse o perna-de-pau, caminhasse em
sua direção, ficasse em sua frente e o pegasse pelos braços, levantando-o.
– Moleque!
Safado! Quem é o Juventino? Quem?
Vermelho, segurando
o infeliz, ele se aproximou de um armário, ao lado da porta, e o colocou
sentado no tampo, a quase dois metros de altura. Assustado e humilhado, o
garoto implorava pelo socorro de seu carrasco, enquanto este se dirigia para um
lugar no fundo da sala, indiferente, saboreando antecipadamente o desfecho de
sua vingança.
– Me põe no
chão, o professor vai chegar!
Quando o
Professor Durvalino entrou na sala, todos os alunos se levantaram, como de praxe.
Ele olhou para o topo do armário e dirigiu-se à sua mesa. Antes de sentar, encarou
o aluno, olhos de quem começava a se divertir com a cena.
– O que você
está fazendo aí?
A classe
explodiu numa gargalhada. O professor olhou para a turma e apontou o dedo para o
aluno mais alto, exatamente o Antonio Carlos, praticamente adivinhando quem teria
sido o autor da proeza.
– Você aí,
Antonio Carlos, faça o favor de tirar o moleque de cima do armário!
Todos
ficaram em silêncio enquanto o pedido era atendido, mas os sorrisos irônicos do
Professor Durvalino e do Nenê indicaram que justiça fora feita. O professor
mandou todos os alunos sentarem e iniciou a aula, como se nada houvesse
acontecido.
Fui aluno do Durvalino e conheci bem a peça. Só fico imaginando a cara do homem.
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